O Anjo da Ventura e José Dulce: Um Encontro com a História Viva de Cáceres

rota cacerense
12 de ago.
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Ao caminhar pelas ruas de Cáceres, é impossível não sentir o peso da história que se mistura ao calor e à brisa do Rio Paraguai. Entre casarões coloniais e lembranças do tempo em que a cidade pulsava como um dos principais polos comerciais da região, um detalhe chama a atenção de quem olha com mais cuidado: a imponente escultura do Anjo da Ventura.

Mais que uma obra de arte, ela é um fragmento vivo de um período de prosperidade, coragem e visão empreendedora — e carrega consigo a história de um homem que ajudou a moldar o destino de São Luiz de Cáceres: José Dulce.

A Chegada do Anjo

A escultura, com cerca de 150 kg de antimônio, chegou a Cáceres por volta de 1890. Encomendada, ao que tudo indica, de um artista italiano ainda não identificado, foi trazida por José Dulce para coroar o prédio neoclássico de sua renomada casa comercial, conhecida pelo sugestivo nome "Ao Anjo da Ventura".

Localizada na esquina das atuais ruas Comandante Balduíno e Coronel José Dulce, a edificação original ostentava portas em arco com ferragens artísticas, colunas coroadas por capitéis harmoniosos, vidros coloridos e balaústres elegantes. O anjo, no topo, parecia vigiar a cidade, como um presságio de bons ventos e prosperidade.

José Dulce: O Visionário de Cáceres

Nascido em 1847, em Gênova, na Itália, José Dulce era um homem de espírito inquieto. Aos 19 anos, desembarcou em Buenos Aires, Argentina, onde iniciou sua trajetória no comércio. Durante a Guerra do Paraguai, tornou-se mascate, acompanhando tropas e vendendo mercadorias nos acampamentos militares.

Chegou a Corumbá, mas foi em 1871, já em Cáceres, que seu talento comercial floresceu. Com uma visão à frente de seu tempo, começou a comprar e estocar couros bovinos — um produto até então desprezado — para exportá-los à Inglaterra, obtendo lucros expressivos.

Ao lado de Leopoldo Lívio D’Ambrósio, fundou a José Dulce & Vilanova, empresa que logo se tornaria referência em artigos importados e nacionais. Mais tarde, comprou a parte do sócio e expandiu os negócios para o transporte fluvial, sendo proprietário do famoso Vapor Etrúria, que ligava Cáceres a Corumbá com conforto e capacidade para cargas e passageiros.

O Simbolismo da Escultura

O Anjo da Ventura é uma figura feminina alada, com a perna esquerda apoiada sobre um globo e a direita levemente flexionada para trás. Na mão esquerda, segura um objeto esférico cravejado de estrelas; na direita, um cetro encimado por outra estrela.

A túnica drapeada, esvoaçante, revela parte da perna, transmitindo sensação de movimento, como se estivesse prestes a alçar voo em direção ao Norte. Sua cabeça, suavemente erguida, parece buscar inspiração no horizonte.

Não é apenas uma obra decorativa: o anjo simboliza ambição, prosperidade e esperança — valores que marcaram a trajetória de José Dulce e a própria história de Cáceres no final do século XIX.

Visite e Descubra

Hoje, o Anjo da Ventura continua sendo um convite para que moradores e visitantes mergulhem na memória da cidade. Ao conhecer a história dessa escultura e do homem que a trouxe, o turista não apenas contempla uma obra de arte, mas também revive um período de efervescência econômica e cultural que ajudou a moldar a identidade cacerense.

Ao passar por Cáceres, olhe para cima — e permita-se encontrar o olhar sereno e confiante do Anjo da Ventura. Ele guarda segredos de um tempo em que o rio era rota de sonhos e negócios, e a cidade respirava o otimismo dos que acreditavam no futuro.

Dica Rota Cacerense: Inclua no seu passeio uma visita ao entorno histórico onde o Anjo da Ventura brilhou no topo de sua antiga morada. É uma parada obrigatória para quem deseja compreender a alma de Cáceres.